Formada por uma quase integridade de atletas que vivem já bastante distantes do mundo brasileiro, o escrete verde-e-amarelo já consolidava um significativo (mal) presságio, pois a essa distância da realidade nacional assomava-se o fato de sermos uma nação repleta de “homens cordiais”, em sua maioria pacatos, silenciosos e inertes, dentre os quais aqueles onze homens não poderiam esconder qualquer segredo diferente.
E foi isso mesmo que aconteceu.
Estrelas do show businnes global, astros do merchandising internacional e popstars do faz-de-conta mundial, a preocupação de cada um apenas com a vida própria e de seus familiares justifica-se plenamente, nos mesmos moldes em que é (pretensamente) justificado o individualismo egocêntrico do regime anti-social vigente em quase todo o resto da Terra.
Toda essa maldita realidade – a misturar a “cordialidade” do selecionador com os seus comandados, a “inércia” de quatro futebolistas em linha a olhar o gol adversário e, novamente, de um parvo gestor de talentos (sic) cagado e mumificado perante a realidade campal, o "egocentrismo" de um pseudocapitão na busca de recordes pessoais, e, finalmente, o “espírito do capitalismo” simbolizado em uma faixa na cabeça do mercadológico melhor do mundo (mas, na verdade, uma rara espécie de homem-foca do Cirque de Soleil) –, apenas fora ratificada, talvez em definitivo, naquele estádio alemão.
No estágio e, principalmente, no formato atual de globalização, talvez seja hora de rever a política de destacamento de atletas nacionais para a disputa de competições deste porte, afinal, os pensamentos, as motivações e as necessidades estampadas no cotidiano e nas atitudes de cada um daqueles homens em (quase) nada representava esta terra brasilis, pois a sua maioria era formada por cidadãos que não buscavam mais nada no futebol ou no reconhecimento pela terra-mãe.
Não há nenhum misticismo, nenhuma teoria conspiratória, nenhum pacto diabólico ou mesmo nenhuma enfermidade físico-psíquica coletiva que pretendam justificar o vexame deste final de semana, pois o que houve apenas está a representar o mero produto cartesiano do sistema que rege as relações humanas atuais.
Não se tenham devaneadoras dúvidas: o que está em jogo é muito mais que uma partida que pára o Brasil, e muito menos que uma vil partida que possa macular cabeça, tronco e membros destes atletas-propaganda.
Embora não assente na mente sapiente de poucos milhares de cidadãos instruídos – ainda que a emoção às vezes suplante a razão –, machuca saber que em milhões de pessoas a tristeza e o desespero de ver desonrada as cores da bandeira em um campo de futebol sobressaia à tristeza e ao desespero de ver diuturnamente maculada as cores nacionais no campo da política, com a falta de democracia econômica e a desigualdade humana; porém, tratar com descaso e desídia um jogo que para a maioria de nossa gente é o único momento de retificação social – em cujo quadriênio aponta para um carnaval de trinta dias e para uma temporária unificação nacional –, é o maior e mais epidêmico dos males.
Agora, resta acreditar que aos poucos a nossa civilização desprende-se deste fúteis laços e fita-se de modo mais realista e importante nas verdadeiras questões nacionais, bem diferente da não observada nesta Copa do Mundo.
Enfim, deve-se abrir e roçar os olhos para enxergar o que realmente apareceu neste último sábado, pois o que se viu não foi uma “pátria de chuteiras”.
Viu-se, simplesmente, um amontoado de chuteiras multinacionais, sem pátria, sem corpo e com a alma alugada.