fdsUm grupo de jovens estudantes da respeitada Faculdade de Direito de Curitiba (FDC), dizendo-se assíduas leitoras deste blog (!), pedem-me para colaborar num trabalho que desenvolvem para o seu Curso, na cadeira de "Sociologia e Antropologia Jurídica", e cujo tema é "Acesso à Justiça no Brasil", com o objetivo de conhecer o perfil do nosso jurista. Quase sera tamen, publico a entrevista concedida.
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fds1) Para o senhor, o que é acesso à justiça?
fdsPodemos conceber o acesso à justiça sob dois aspectos: stricto sensu e lato sensu. Sob a primeira ótica, a própria Constituição da República já prevê em alguns dos seus tantos dispositivos alguns aspectos formais e materiais deste sentido, a pretender consagrar um imaculado acesso à justiça judiciária (art. 5°, LXXIV, art. 115, art. 125, entre outros); logo, pretende-se assegurar que ninguém será afastado da busca dos seus direitos, inclusive a prever a gratuidade da justiça, a Defensoria Pública no âmbito da União e dos Estados e, no âmbito das justiças comum, federal e trabalhista, a descentralização dos tribunais. Lato sensu, pode-se entender como acesso à justiça a possibilidade de todo e qualquer cidadão efetivamente ter concretizado ou buscar a concretização dos seus direitos e das suas garantias fundamentais consagradas na nossa Carta Maior.
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fds2) Quais são os principais obstáculos ao acesso à justiça no Brasil?
fdsCabe expor fatores das mais diversas ordens: legais, com uma enfadonha legislação processual, sócio-culturais, com a ignorância e a (in)consciência do povo e com o descrédito e o temor do mesmo pela atuação do Judiciário, e institucional- econômicas, com uma estrutura de serviços de acesso a justiça turva e capenga, com as altas custas judiciais (e periciais, e cartorárias, e advocatícias...) para quem fica entre o pobre e o rico, e o alto custo para ir ao Judiciário, no caso das populações afastadas dos grandes centros.fdsAssim, exponencialmente, os maiores obstáculos residem justamente na consecução material desse acesso à justiça, como por sinal geralmente acontece com as constituições programáticas, e que não poderiam ser diferentes num país tão desigual e tão pobre sob o ponto de vista educacional-escolar como o nosso. Assim, a estes dois aspectos – cernes do nosso atraso e do nosso subdesenvolvimento – assomam-se a estrutura do nosso Judiciário – bastante custosa para grande parte do povo –, a desconfiança da população perante o seu funcionamento e o descrédito da mesma em relação ao longo tempo para a decisão definitiva das demandas, variáveis que, mais do que obstáculos ao acesso à justiçã, funcionam como repelentes.fdsOutrossim, não se pode olvidar dos parcos investimentos feitos nas nossas defensorias públicas e da pouca atenção dada pela OAB em trabalhos relacionados à advocacia dativa.
fdsfds3) O que pode falar sobre a assistência judiciária gratuita e a defensoria pública no Brasil?
fdsPrecisa-se avançar ainda muito. Não basta liberar o jurisdicionado pobre das custas judiciais ou a ele oferecer uma defensoria pública, infelizmente, desaparelhada. A maior necessidade é permitir que todo cidadão, independentemente do seu status social, tenha na prática as mesmas garantias recursais oferecidas ao cidadão rico, que consegue, pelo capital, manter dúzias de advogados trabalhando incessantemente na busca de brechas processuais. Para isso é vital que o Estado – no âmbito de todos os entes federados –invista, mais e mais, numa Defensoria Pública capaz de atender essa demanda e efetivamente honrar o seu papel, hoje limitado e (quase) esquecido pelo erário.
fdsfds4) Como observa a eficiência do poder judiciário face ao tempo para resolução dos conflitos, linguagem utilizada e custas judiciais?
fdsNeste ponto se observam muitas mudanças e avanços.; entretanto, é evidente que no tocante ao tempo para a definitiva resolução dos conflitos não estamos num nível minimamente satisfatório. Mas isso não é privilégio do Brasil, pois na Europa, conforme último trabalho realizado pelo Comitê de Justiça da União Europeia, o tempo média para a conclusão dos processos judiciais ultrapassa 10 anos, quando chegam nas supremas cortes nacionais. Porém, lá o problema não tem as mesmas raízes: aqui, embora alçado pela EC 45/2004 como direito e garantia fundamental, a (des)confirmação de um processo célere e com uma duração razoável praticamente contradiz-se pela insustentável manutenção das (quase) infinitas brechas recursais proporcionadas pelos nossos processos civil e penal, que clamam por uma urgente reforma, a atingir diretamente o caos da lentidão das decisões.fdsA pergunta que fica é se acelerar todo o trâmite judicial e obter respostas muito mais rápidas do Judiciário interessa às tropas de elite burguesa e política, aos donos do poder da nossa República que invariavelmente são partes de tantos processos penais, a maior parte relacionados a crimes tributários, financeiros, eleitorais ou contra a Administração Pública.fd No que tange às custas judiciais e à linguagem utilizada pelos nossos operadores do Direito, acredito que a evolutiva mudança mostra-se mais visível. No primeiro caso, pela própria facilidade que a lei confere àqueles que, bastando declararem-se pobres, são isentos de quaisquer custas; e, no segundo, pelos textos decisórios de alguns magistrados – que (muito bem) conseguem aliar as inteligências jurídica, literária e emocional nos seus julgados, tornando a decisão acessível e didática para todos os jurisdicionado – e pela linguagem que vem sendo utilizada por juízes, promotores e delegados, em especial nas audiências e nas entrevistas coletivas, a qual, com cada vez mais frequência, vem se mostrando mais próxima dos cidadãos.
fds
fds5) O Sr. vivenciou alguma experiência que possa contribuir na questão do acesso à justiça?
fdsA todo instante, reflexamente ou não, deparamo-nos com casos destes, que antecipam a injustiça, causam o desgosto pelo Direito e catalisam a ira e outros mais nefastos sentimentos humanos, a culminar no recrudescimento de uma sociedade cada vez mais individualista, pois, uma vez que incapaz de ver a sua busca pela justiça atendida, acredita que aquelas desumanas concepções de relações sociais, assentes na exortação ao eu – lei de talião, anarquismo, leis da sociedade do espetáculo etc. –, são as melhores a serem seguidas, provocando a eternização do caos social.fdsNa verdade, quando vemos pessoas a morrer em filas de hospitais, sem acesso à saúde, quando vemos crianças e jovens sem escola e sem acesso à educação, quando vemos professores e policiais mal remunerados, sem acesso a um salário constitucionalmente mínimo, quando vemos crianças, jovens, adultos e idosos a cavoucar em lixos, a mendigar em esquinas, a dormir sob marquises e a clamar por um prato de comida, sem acesso, portanto, a uma vida digna, vemos ser afrontada a questão do acesso, humano e divino, à justiça.fds
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fds1) Para o senhor, o que é acesso à justiça?
fdsPodemos conceber o acesso à justiça sob dois aspectos: stricto sensu e lato sensu. Sob a primeira ótica, a própria Constituição da República já prevê em alguns dos seus tantos dispositivos alguns aspectos formais e materiais deste sentido, a pretender consagrar um imaculado acesso à justiça judiciária (art. 5°, LXXIV, art. 115, art. 125, entre outros); logo, pretende-se assegurar que ninguém será afastado da busca dos seus direitos, inclusive a prever a gratuidade da justiça, a Defensoria Pública no âmbito da União e dos Estados e, no âmbito das justiças comum, federal e trabalhista, a descentralização dos tribunais. Lato sensu, pode-se entender como acesso à justiça a possibilidade de todo e qualquer cidadão efetivamente ter concretizado ou buscar a concretização dos seus direitos e das suas garantias fundamentais consagradas na nossa Carta Maior.
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fds2) Quais são os principais obstáculos ao acesso à justiça no Brasil?
fdsCabe expor fatores das mais diversas ordens: legais, com uma enfadonha legislação processual, sócio-culturais, com a ignorância e a (in)consciência do povo e com o descrédito e o temor do mesmo pela atuação do Judiciário, e institucional- econômicas, com uma estrutura de serviços de acesso a justiça turva e capenga, com as altas custas judiciais (e periciais, e cartorárias, e advocatícias...) para quem fica entre o pobre e o rico, e o alto custo para ir ao Judiciário, no caso das populações afastadas dos grandes centros.fdsAssim, exponencialmente, os maiores obstáculos residem justamente na consecução material desse acesso à justiça, como por sinal geralmente acontece com as constituições programáticas, e que não poderiam ser diferentes num país tão desigual e tão pobre sob o ponto de vista educacional-escolar como o nosso. Assim, a estes dois aspectos – cernes do nosso atraso e do nosso subdesenvolvimento – assomam-se a estrutura do nosso Judiciário – bastante custosa para grande parte do povo –, a desconfiança da população perante o seu funcionamento e o descrédito da mesma em relação ao longo tempo para a decisão definitiva das demandas, variáveis que, mais do que obstáculos ao acesso à justiçã, funcionam como repelentes.fdsOutrossim, não se pode olvidar dos parcos investimentos feitos nas nossas defensorias públicas e da pouca atenção dada pela OAB em trabalhos relacionados à advocacia dativa.
fdsfds3) O que pode falar sobre a assistência judiciária gratuita e a defensoria pública no Brasil?
fdsPrecisa-se avançar ainda muito. Não basta liberar o jurisdicionado pobre das custas judiciais ou a ele oferecer uma defensoria pública, infelizmente, desaparelhada. A maior necessidade é permitir que todo cidadão, independentemente do seu status social, tenha na prática as mesmas garantias recursais oferecidas ao cidadão rico, que consegue, pelo capital, manter dúzias de advogados trabalhando incessantemente na busca de brechas processuais. Para isso é vital que o Estado – no âmbito de todos os entes federados –invista, mais e mais, numa Defensoria Pública capaz de atender essa demanda e efetivamente honrar o seu papel, hoje limitado e (quase) esquecido pelo erário.
fdsfds4) Como observa a eficiência do poder judiciário face ao tempo para resolução dos conflitos, linguagem utilizada e custas judiciais?
fdsNeste ponto se observam muitas mudanças e avanços.; entretanto, é evidente que no tocante ao tempo para a definitiva resolução dos conflitos não estamos num nível minimamente satisfatório. Mas isso não é privilégio do Brasil, pois na Europa, conforme último trabalho realizado pelo Comitê de Justiça da União Europeia, o tempo média para a conclusão dos processos judiciais ultrapassa 10 anos, quando chegam nas supremas cortes nacionais. Porém, lá o problema não tem as mesmas raízes: aqui, embora alçado pela EC 45/2004 como direito e garantia fundamental, a (des)confirmação de um processo célere e com uma duração razoável praticamente contradiz-se pela insustentável manutenção das (quase) infinitas brechas recursais proporcionadas pelos nossos processos civil e penal, que clamam por uma urgente reforma, a atingir diretamente o caos da lentidão das decisões.fdsA pergunta que fica é se acelerar todo o trâmite judicial e obter respostas muito mais rápidas do Judiciário interessa às tropas de elite burguesa e política, aos donos do poder da nossa República que invariavelmente são partes de tantos processos penais, a maior parte relacionados a crimes tributários, financeiros, eleitorais ou contra a Administração Pública.fd No que tange às custas judiciais e à linguagem utilizada pelos nossos operadores do Direito, acredito que a evolutiva mudança mostra-se mais visível. No primeiro caso, pela própria facilidade que a lei confere àqueles que, bastando declararem-se pobres, são isentos de quaisquer custas; e, no segundo, pelos textos decisórios de alguns magistrados – que (muito bem) conseguem aliar as inteligências jurídica, literária e emocional nos seus julgados, tornando a decisão acessível e didática para todos os jurisdicionado – e pela linguagem que vem sendo utilizada por juízes, promotores e delegados, em especial nas audiências e nas entrevistas coletivas, a qual, com cada vez mais frequência, vem se mostrando mais próxima dos cidadãos.
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fds5) O Sr. vivenciou alguma experiência que possa contribuir na questão do acesso à justiça?
fdsA todo instante, reflexamente ou não, deparamo-nos com casos destes, que antecipam a injustiça, causam o desgosto pelo Direito e catalisam a ira e outros mais nefastos sentimentos humanos, a culminar no recrudescimento de uma sociedade cada vez mais individualista, pois, uma vez que incapaz de ver a sua busca pela justiça atendida, acredita que aquelas desumanas concepções de relações sociais, assentes na exortação ao eu – lei de talião, anarquismo, leis da sociedade do espetáculo etc. –, são as melhores a serem seguidas, provocando a eternização do caos social.fdsNa verdade, quando vemos pessoas a morrer em filas de hospitais, sem acesso à saúde, quando vemos crianças e jovens sem escola e sem acesso à educação, quando vemos professores e policiais mal remunerados, sem acesso a um salário constitucionalmente mínimo, quando vemos crianças, jovens, adultos e idosos a cavoucar em lixos, a mendigar em esquinas, a dormir sob marquises e a clamar por um prato de comida, sem acesso, portanto, a uma vida digna, vemos ser afrontada a questão do acesso, humano e divino, à justiça.fds