Ainda sou da época em que as famílias se reuniam em torno da mesa para comer e conversar.
Pequenas, grandes,
ainda que apenas aos fins de semana, enfim, havia o hábito desta reunião, da
conversa de balanço do dia ou da semana, da divagação de expectativas e
frustrações, tudo desmascaradamente pulsante.
Mudaram os tempos,
mudaram as famílias e (não só) este costume tem perdido espaço.
A nova dinâmica da relação espaço-tempo – fruto das globalizações – e a reconformação do papel da família – em termos
de importância, de nucleação e de eticidade – transformaram aquele e outros tantos hábitos.
Veio o
fenômeno da desfamiliarização.
Sim, novos centros do
cotidiano, novas perspectivas relacionais, novas ideias, novas vontades e novas
necessidades que foram sendo construídas pela inaptidão do berço familiar em
formá-las, supri-las e compreendê-las.
Sair da família, em
tese, era sair do reacionário, da vigília, do medo, da punição.
Criar agrupamentos fora
do sangue nosso de cada dia seria quase como uma condição de sobrevivência – ou
mesmo de existência.
Tem-se outras famílias, outros núcleos, e de modo algum ruim,
pois insistente na condição do intercâmbio físico, plural e ressonante do ser humano.
Ademais, fez-se romper a ideia da interação física.
E até se compreende, haja vista a velocidade do cotidiano, a profusão de simultâneos eventos e, mais ainda, o fim das cercas culturais que nos prendiam à mesma terra por toda a vida.
Porém, agora, o que acontece é a "individuação" e a sua metalinguagem do mundo virtual, sob o falso conforto das redes sociais, como neste negócio assustador chamado "facebook".
Hoje, cada qual pega
a sua comida, senta-se na frente da sua preferida tela e come.
E não mais dialoga,
apenas vendo passivamente todo o mundo passar à sua frente, sem se complicar,
sem se afetar, sem pertencer a nada.
Ou dialoga com si,
por meio dos seus vários “eus” e para um mundo virtual de outros tantos
personagens pasteurizados, líquidos, liquidificados.
E se a interação na
rede não interessa, aperta um botão e dá adeus.
Mas dar adeus ao cotidiano real e se desconectar das
relações humanas, e das relações tão intimamente humanas,
não é tão (ou nada) fácil.
Não é como um álbum de figurinhas para se colecionar, preencher e largar, tão-pouco produtos de gôndolas que se retiram, se usam, se curtem e se descartam.
O mundo real, vivo, a cores, com pele, tato, osso e sujeira, é um pouco diferente.
E como tudo hoje quer
se mostrar mais simples, descartável e descomprometido, aos poucos cada um vai
perdendo a capacidade de “ter-e-querer-se-envolver“ nos relacionamentos, de se dedicar e de se apresentar.
E de se fazer presente, vivamente presente.
Ora, buscar viver uma vida sem transformar
os conflitos que valem a pena resulta numa vida que não vale a pena – e a
vida, além de chata, seria vazia.
Como sem sentido e anoréxica é esta vida oniricamente enraizada num monitor, fantasiosamente criada sob esta retumbante pseudorrealidade social.
E plugada no nada.