terça-feira, 7 de outubro de 2014

# cheiro do ralo


E o Governo tanto demora a fazer que aí está o resultado.

Os tais manifestos de junho do ano passado (v. aqui, aqui, aqui e aqui), a reboque da direita, e o ódio de classe, figurado no "tudo menos o PT", eram retumbantes sinais da ameaça de perder a eleição presidencial, ainda que a concorrência fosse débil.

Primeiro, a turma que parou o país por algumas semanas de 2013, ao cabo, votou sim em projetos e senhores capazes de promover mudanças.

Mudanças para voltar no tempo.

Mudanças para bem-fadar Jair Bolsonaro (o deputado mais votado do Rio), Pastor Feliciano (o 3º mais votado de SP), Ratinho Jr. (o mais votado do PR), Lasier Martins (senador eleito no RS), Beto Richa (v. aqui e aqui) e Aécio Neves, só para ficar em alguns.

Toda uma turma que, flagrantemente, está a representar teses e programas do chorume da política, dos anos de chumbo, dos anos de chupa-que-a-cana-é-doce, dos anos que se pensavam guardados para sempre nas páginas tristes dos nossos livros de História (v. aqui).

Agora, vejam só, muda-se tudo para tudo voltar ao que era em priscas eras.

Reacionários, conservadores e neoliberais numa geleia geral que revela o quanto foi oportunista e safada a espetacularização daquelas manifestações. E quão vazias essas foram nos seus fins, pois Luciana Genro, Plínio Sampaio, comunistas e operários -- os profetas dos novos tempos, sabe-se lá o que queiram ser e dizer com isso -- continuaram a não ter votos.

A grande mídia, desregulada, alimentada e protegida como um mico-leão dourado, foi exímia ao colar na testa do PT a propriedade plena da incompetência e da corrupção, sem querer levar esse assunto para o debate sério e verdadeiro (v. aqui).

E com tamanha eficiência levou Dilma e o partido para o canto do ringue, apanhando muito, apanhando tanto quanto bastasse para que a população não se desse conta de que o Brasil, de 2003 para cá, é outro.

E de que há sim uma pessoa e um partido responsáveis por isso: Lula e o PT, bastante competentes neste propósito de tirar da fome e da miséria abjeta o equivalente a dois Chiles.

Mas, infelizmente, isso hoje vai se apagando a cada manchete sensacionalista, a cauda pauta negativa, a cada fato a dedo escolhido para desancar toda estes feitos, tudo sem um contraponto, sem uma resposta eficaz do Governo.

O PT, embora seja o maior partido político do Brasil, segue contraditoriamente acuado, sem comunicação, sem espaço, sem jeito e sem tempo para mostrar tudo o que bem faz -- não obstante as devidas críticas aos vários erros do mandato atual, como aqui (aquiaqui e aqui) já se disse, em especial pelo flagrante esgotamento deste modelo de commodities e consumo -- e então reagir.

Embora ainda continue com o maior número de representantes, perdeu espaço no Congresso Nacional. E embora tenha vencido o 1º turno, vê renascer do inferno a direita com os tucanos e seus canhões.

A bala de prata contra o maior partido da oposição -- a troika dos sistemas Globo, Veja e Folha -- seria a imprescindível  "Lei de Meios de Comunicação", que colocaria ordem no bandido mundo midiático, mas que está engavetada (v. aqui). Uma lei que no mundo inteiro já existe, menos por aqui, onde é vista como "censura", como "ditadura", como "cubanismo" ou como qualquer outra coisa que zombe para dissimular a verdade.

Mas, se ainda insistisse em não querer dispará-la, o Governo Federal ao menos deveria ter mexido na gestão da comunicação, criado e aperfeiçoado meios de dialogar e de se apresentar à população, como aqui e aqui já se explicou. E, ainda, deveria ter estancado o mar de dinheiro que, por meio das suas tantas empresas públicas, a cada ano despeja nas grandes redes em venturosas publicidades sem sentido.

Enfim, um vacilo atrás do outro.

Depois, na eleição presidencial, o voto em Aécio não é seriamente explicado, mas motivado pelo mais pueril (e juvenil) argumento: "não gosto" do PT, como se tratasse de um pudim, e "não gosto" da Dilma, como se fosse uma escolha de amiga de escola ou para miss simpatia.

Ora, em jogo está a discussão do Brasil, a discussão de um projeto de Estado e de ações políticas que está, qua sera tamen, transformando o país, bem ao contrário do retrocesso, da estagnação, da elitização e do vazio social dos programas pilotados pela direita de hoje e de sempre.

Ademais, eis então a verdade recôndita nesta onda conservadora (e reacionária) que vota no candidato do PSDB: o ódio de classes, o ódio de castas, algo bem mais sórdido, simples e direto do que tentar entender ou compartilhar do modelo neoliberal que escancara as políticas desse partido.

A imensa parcela dos 33% que votou em Aécio tem nojo de se ver no outro, tem ojeriza do convívio com quem não nasceu de sangue azul e nem habitou a casa-grande, mas que hoje pode estudar, viajar e conjugar o infausto verbo do pertencimento pós-moderno: consumir.

Uma gente que se indigna com o fato da senzala já não aceitar se servir como escravos domésticos, já não admitir perder direitos e já poder se enxergar, minimamente, como dona de cidadania.

Uma gente que tem pavor ao ver que seu país está a dar oportunidades de emprego, estudos, de cursos técnico-profissionalizantes, de microcrédito e na agricultura familiar a dezenas de milhões de brasileiros, e que isso é obra de um partido que na sua história, mais ou menos, sempre teve um lado.

Uma gente que não suporta um governo social e que se governa pelo lado esquerdo peito.

Que não aceita políticas públicas populares, populistas e para ao povo. 

Que não acredita na política, na república e na democracia.

Que tem chiliques ao perceber que o país deve ser de todos.

Afinal, para esta gente o Brasil não somos nós.