Benjamin fará amanhã – que parece nunca chegar – dois anos.
Aqui, longe, nesta outra cidade deste outro Estado desta outra região do nosso mesmo país, atropelo-me na imensa solidão do areal de Copacabana para na cabeça dele tentar entrar.
Ele ainda pouco sabe de tudo.
E talvez por isso – vá saber –, ele pode imaginar o que bem quiser.
E por isso ardo em aflição.
O que será que ele imagina de mim?
Afinal, assim como ele acredita em dragão, dinossauro, pirata de olho-de-vidro e numa lunática esponja amarela, ele deve acreditar neste super-homem aqui.
No dia a dia, olha-me como se visse um ser capaz de voar, de não ter dor, de ter toda a força do mundo, de escolher sempre os melhores caminhos, de parar o trânsito, de saber sobre tudo o que não para de falar, de saltar tsunamis que arrebentam nas nossas pernas, de num toque de botão mágico fazer notas brotarem numa boca de caixa, de se esticar como borracha para chegar ao teto de tudo, de chutar uma bola e manusear esquadros como nenhum outro ser do planeta é capaz de fazer...
Enfim, imagina alguém mais-que-perfeito, alguém superlativo, alguém hiperbólico, alguém coletivo em si mesmo – isso, ele me vê como uma espécie de batalhão, de nuvem, de cáfila, de alcateia de um homem só.
E acredita em mim como um eu que não devo ser.
Na verdade, não sei o que ele gostaria que eu fosse -- e não ser o herói que ele hoje sonha talvez até me frustre.
Ensimesmo, entretanto, eu prefiro não acreditar nisso.
E, para continuar tentando fazer de mim este personagem mítico, não ouso abusar das fantasias.
Tento, originalmente, usar apenas a alma de pai.