Quando o Club Athletico Paranaense entrar em campo hoje, na nova velha Baixada, pela Copa Libertadores da América, recomeçará outra batalha da guerra que representa disputar o maior campeonato de futebol do planeta.
Sim, meus amigos, a peleja de logo mais será outra amostra da saga por esta Taça, que se soergue como máximo culto ao velho e rude esporte bretão.
É aqui, pela nuestra América, onde o futebol é jogado na sua essência, na sua pureza, onde maestros, corvos, deuses e hinchas desfilam juntos em epopeias dantescas: aqui é o "Inferno", meus senhores.
Aqui é onde cada esquadra vagueia conduzida por seus carontes nos reinos das sombras sul-americanas.
Mas, atentem, o que se carrega não são reles almas mortas.
São jogadores.
São heróis, vilões, guerreiros, ídolos, múmias e até amargas ínguas na escura travessia dos mais de nove círculos em busca do céu libertador.
Ora, não me venham com a realeza das arenas belgas climatizadas.
Nem as pompas dos gramados de pastagem de vacas premiadas holandesas.
Nem as elegantes lantejoulas dos uniformes demi-sec franceses.
Nem a seda dos tronos imperiais das tribunas inglesas.
Nem o brilho comportamental dos torcedores alemães e seus canecos de vidro encervejados.
E nem toda aquela fascinação medúsica provocada pelo escrete barcelonês ou liverpooliano.
Não, meus amigos, não.
Este nosso jogo é incapaz de ter a beleza pornográfica de todos aqueles espetáculos europeus, de ter a fleuma civilizatória do bom selvagem do velho mundo e de ter o bolo bilionário de tantos euros.
Ela tem, diria Vinícius e batucaria Baden, "qualquer coisa" além da beleza.
Ela tem qualquer coisa de triste, que chora, que sente em cada carrinho e em cada cotovelada a saudade da Casa.
Afinal, nesta Copa tudo extraterritorial é terra inimiga, quase sem-lei, proibida para menores e tratada com tarja preta.
E mais.
Ela tem uma beleza que, embora bata na tristeza de um molejo de amor sangrado da sobrancelha aberta e machucada, transborda em uma alegria sublime, incompatível a qualquer outra de padrão europeu.
Aqui, meus caros, sofre-se profundamente pelas mais depauperados escretes, rasga-se e morde-se pelo mais irraciocinado dos amores.
E se chora, e se grita, e se late, e se morre, se arrebenta e se abrem as veias sulamericanas para que tudo acabe em um deleite que não se entope, que não se explica.
Porque não tentem convencer chilenos, uruguaios ou argentinos do contrário.
Ora, todos sabem que as suas cores representam uma paixão única, daquelas feitas apenas para amar e para ao final sofrer de um eterno amor.
Ora, todos sabem que as suas cores representam uma paixão única, daquelas feitas apenas para amar e para ao final sofrer de um eterno amor.
Como aqui, com o coração rubro-negro que confirmará, luta a luta, a alma em frangalhos de um sofrimento inacabado em infinitos noventa minutos.
Senhores, a Copa Libertadores da América é assim: feita de paixão, feita de sangue, suor, socos e lágrimas, como em nenhum outro canto desportivo da Terra.
E hoje nada mais importa neste Reino de Bolívar, Artigas y San Martín senão estar no caldeirão, em nossa trincheira, empurrando nosso time à mais outra grande vitória.
Saravá!