segunda-feira, 20 de abril de 2009

# 100 anos: as intermitências da morte


fdsfdsA família Okocha já vinha definhando, fato este notório pelo mais absoluto esquecimento a que os seus remanescentes se sujeitavam. Nada mais a motivava e nada mais a despontava. Sinceramente, parecia que nada mais a faria renascer e sobreviver, tamanho era o fugaz declínio daquela linhagem. Sim, os Okochas, um a um, iam morrendo.
fdsfdsPorém, quase nas cinzas, eis que o patriarca recebe um recado do além: a morte lhe daria uma sobrevida. Sim, numa carta a Sra. Morte dizia que daria ao Vovô Okocha a oportunidade de esperar chegar aos 100 anos, e que, se alcançado o centenário, toda a família passaria a também gozar desta quase eternidade. Era, finalmente, uma chance dada aos Okochas de se manterem vivos.
fdsfdsA condição, sine qua non, era única: não vacilar neste caminho ao centenário, devendo os Okochas passar incólumes pelos Snurfs, os gigantes azuis, e, depois, vencer o temível Ouragan na grande batalha final.
fdsfdsAlegre, toda a família Okocha não se continha na expectativa de ver no seu Vovô – com as suas longas barbas, os seus brancos cabelos e a pele já cansada pelos sofrimentos que lhe acometem desde o final do século passado – a esperança de se recriar, de reviver e de se mostrar impávida e colossal no cenário medieval. Com uma população envelhecida e oprimida, era a chance – última, talvez – dos Okochas sobreviverem e, finalmente, voltarem a conseguir duelar com os Ouragans, esta a mais tradicional família que em vermelho-e-preto domina todo território.
fdsfdsA redenção proposta pela morte conflitava com o angustiante caminho a ser perseguido pelos Okochas. Eles não poderiam vacilar. Eles tinham que estar preparados para tudo e todos. Mas a morte parecia mesmo inevitável. Eram tantos altos e baixos, tantos (efêmeros) sucessos e (inesquecíveis) insucessos que o desastre parecia iminente. La crónica de una muerte anunciada, dizia-se alhures.
fdsfdsÉ verdade que todos sonham com um mundo de eternidade absoluta. Mas, ao mesmo tempo, todos afirmam, com patética coragem, que a morte faz parte da vida. São, estes, os clichês com que todos embalamos nossas mágoas nos funerais das nossas rotinas. E assim é que os Okochas pareciam tratar daquele momento.
fdsfdsPorém, nas vésperas de enfrentar os gigantes azuis, uma surpreendente força sobrenatural parecia empurrar a família para a glória. Parecia -- sim, parecia! -- que o vento passava a agir em favor dos Okochas. Desgovernado, um quase furacão avançava em sentido contrário e parecia permitir que a família Okocha alcançasse o olimpo. Tudo parecia prosperar para tornar os Okochas imortais.
fdsfdsMas eis que chega o dia da primeira batalha. E ela foi inglória. Cambaleantes, sonsos e fracos, toda a otimista expectativa e toda a empolgante preparação rumo ao eterno centenário foram mesmo em vão. De súbito, os Okochas são esmagados e trucidados pelos Snurfs naquela que ficou conhecida como a "Grande Tarde Azul".
fdsfdsNo alto do seu trono, o Vovô Okocha chora compulsivamente, apoiado apenas em sua já gasta bengala. É a morte, que regressa sem tréguas para informar o momento fatal. A dantes incerteza do corredor da morte torna-se certa, aprazando o desaparecimento definitivo dos Okochas.
fdsfds"Tudo se converterá em pó", diz, em voz já trêmula, o velhinho que quase bem faria 100 anos, antes do instante em que finalmente vem a morrer.
fdsfdsE, no dia seguinte, ninguém dos Okochas pôde mais viver. Pelo menos até fazer duzentos anos...

 
fds