terça-feira, 28 de julho de 2015

# aranha verde



Orgulhoso dos dias e noites a vestir rubro-negro e a acompanhar, in loco ou não, o amado clube da Baixada, tinha cá pra mim que aquela quarta-feira nada mais seria senão uma outra noite de futebol para se ver na tv, indolente, na companhia do meu também atleticano pai.

Era 1985 e eu, de muita tenra idade, tinha o futebol como o meu mundo, e assim já era capaz de entender o mundo pelos olhos de um jogo de futebol.

Entretanto, à época, a inocente infância ainda impedia de sofrer na torcida pela desgraça da equipe que ali, numa inusitada final de campeonato brasileiro,  estia verde-e-branco.

E naquela noite e naquele palco pude confirmar que estava a ver um dos grandes jogadores da minha história de futebol.

Que baita atuação, meus senhores.

Soberba, deslumbrante, de encher os olhos de um piá ainda imaculado por quaisquer dos pecados capitais que poderiam proibir de enxergar, no arquirrival, um craque de bola.

A pegar tudo -- ou quase tudo, pois um repicado chute acabou entrando --, aquele sujeito com tipo de vilão de faroeste americano tornou-se o grande responsável pelo resultado final daquele jogo.

E não no naquele, mas de tantos outros daquele torneio de 85.

Um desempenho magistral, homérico, digno de lhe valer uma placa, um busto, uma estátua, um caminhão de bombeiro só para ele -- um Alto da Glória só para ele.

Afinal, ora, não apenas "gols" deveriam merecer tais homenagens, mas também a sua antítese, pela magnânima arte, também lhes é credor.

Ali, naquele jogo, com cada vez mais coragem e competência, parecia um muro vivo, gigante, octópode.

Mais do que isso, parecia a encarnação de alguma divindade abençoada pelos supremos deuses das metas.

Por cima, por baixo, ao longe, de perto, à direita, da esquerda, pelo centro, do corner, pela frente... os milagres deslumbravam a mim e a todo o estádio que contra ele torcia.

Já era um mito, e não só na terra da futura aranha marrom.

Um mito nacional, eterno, impávido e colosso.

Num dos maiores goleiros que vi jogar, Rafael Camarota, a minha homenagem aos coxas, neste aniversário de velhinhos 30 anos daquele título cuja lembrança me foi comovidamente trazida aqui, no ultimo domingo.