sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

# sem magia


Ninguém, absolutamente ninguém, que não queira tentar compreender uma sociedade cujos valores são tão distantes dos nossos será capaz de entender este negócio todo da medicina e dos médicos cubanos, nomeadamente este convênio entre Brasil e Cuba, intermediado pela Organização Mundial de Saúde (v. aqui, aquiaquiaqui e aqui).

A falta de vontade, aliada a uma concepção vazia (alienada) ou repleta de preconceitos, desemboca num festival de besteiras, incapaz de compreender como funciona esta missão de salvar e cuidar de vidas naquele país caribenho.

Cuba tem uma das melhores e uma das mais eficientes (relação custo-benefício) medicinas do planeta porque é independente, porque tem foco e fim no paciente e porque visa a tratar dos elementares problemas de saúde pública (v. aqui e aqui). E divulga, reparte e ganha com isso.

É independente porque construída sob alicerces republicanos, não-capitalistas e não-privados. Sem patentes, é barato custear problemas graves (v. aqui e aqui); sem a pressão dos gigantes laboratórios multinacionais, não se faz dos tratamentos uma pirotecnia, da cura um composto químico, dos pacientes uns robôs ou cobaias e da prevenção um não-assunto; sem o lobby dos grupos médicos privados, faz da saúde pública algo efetivamente de interesse público; e sem a mercantilização do negócio saúde, faz-se simplesmente medicina.

Tendo por objetivo tratar da saúde – e não ganhar dinheiro –, fazer medicina constitui um sacerdócio, uma entrega, uma oportunidade de tratar e salvar a vida das pessoas. E isso não tem dinheiro que pague, pois com a expertise de uma formação humanista, sob o ponto de vista da ética, e técnica, com ênfase na medicina familiar, os médicos cubanos não tem o preço e o custo dos médicos mundo afora, tão-pouco resultados com a mesma eficiência. Ora, como o mundo deles não gira em torno dos compromissos financeiros e pessoais, os médicos cubanos atendem, consultam, conversam, clinicam, tocam, examinam... e não resumem tudo isso a noventa segundos de questões e uma dispensa para exames laboratoriais, sempre rentáveis e de diagnóstico autodidata. Vivem, portanto, para a medicina, e não dela (v. aqui). 

E, como a maioria das doenças e das mortes por problemas de saúde advêm do cotidiano sanitário (atendimentos primários), é nele que são envidados todos os esforços, todos os estudos e toda a pouca grana que se têm. Nele e em medicina preventiva. E por isso a profusão de médicos, de ambulatórios, de postos, de clínicas e da incessante busca pela excelência no tratamento da saúde básica. E por isso os melhores índices do mundo em mortalidade infantil, desnutrição, vacinação, gestação, expectativa de vida etc. (v. aqui)

Por fim, com um contingente médico enorme (v. aqui), Cuba exporta a sua medicina com os seus médicos. E não apenas para fazer dinheiro – e então reinvestir em toda a estrutura nacional –, mas para promoção do seu jeito de fazer medicina e para cumprir o seu princípio constitucional da solidariedade ente os povos, e por isso estão onde os nativos não querem e vão para os nativos precisam.

Tudo isso sem mágica, e sem a ilusão de que esteja tudo ótimo ou de que lá seja o paraíso.

O problema está em acreditar que tudo o que se relatado, inclusive pelas organizações sociais e institucionais internacionais, seja ilusão, e que os mágicos somos nós, em nosso sistema e em nossas verdades.

Aí é pura demagogia, em especial daqueles encastelados.