sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

# lista de schindler

fdsHá uma falsa concepção de "talento" em nossa sociedade, a brasileira fundamentalmente.
fdsDe tempos (eternos) pra cá, a competência e o talento de qualquer um vem traduzidos em pecúnia, em coisas -- é a coisificação do homem e das relações sociais, em suma. Ganhar e acumular dinheiro -- embora a depender das circunstâncias, das razões e das causas, claro, jamais deva ser considerado um crime terreno -- ou exibir marcas e bens elegem-se como as maiores provas para que alguém possa ser considerado competente ou talentoso.
fdsA (excelente e republicana) medida adotada pelo Governo do Paraná, ao tornar público os vencimentos percebidos por todos os servidores do Poder Executivo, traduz ainda mais a falsidade e a improcedência de tal relação.
fdsNão me ative a tal lista -- afinal, cabe ao próprio Governador do Estado, de modo a justificar e dar uma raison d'être a tal medida, criar uma comissão que examine a situação, os descompassos e os absurdos ético-profissionais no âmbito dos planos de cargos e salários, a fim de propor o que deve (e pode) ser feito --, mas tive sim a pecaminosa curiosidade de ver a remuneração de um "servidor", um daqueles ainda responsáveis por firmar a (secular) figura do servidor público brasileiro -- medíocre, inútil (quando não contra-producente) e, ainda pior, improbo --, e lá estão, cumulativamente, injustificáveis e imorais R$ 16.769,45.
fdsEssa excrecência, um exemplo entre tantos, apenas evidencia (i) a malemolência estatal com este tipo de situação -- pois, por culpa própria, não reestrutura as suas "árvores de gestão" e, pior, aguenta toda essa gente tosca e não faz uso da prerrogativa constitucional de mandar embora servidor ineficiente e com baixo desempenho -- e (ii) o absurdo descalabro entre o que se paga para serviços e funções de mesma hierarquia em termos de importância estatal.
fdsAfinal, neste último caso, se a intenção de se ter um Estado é justamente para promover (e induzir) o desenvolvimento, fomentar (e exigir) a justiça econômico-social e reequilibrar as distâncias de classes, nada justifica as brutais diferenças de remuneração existentes e que muito privilegiam, por exemplo, delegados, auditores fiscais e procuradores -- e os "advogados" --, em detrimento dos professores e dos profissionais da base da saúde e da segurança pública.
fdsAnos de estudo para se chegar naqueles primeiros cargos? Grandes responsabilidades que eles exigem? Bull shits. É, sim, apenas mais um ranço da nossa República que dá oportunidades distintas e cria reservas de mercado perenes à nata estatal e àqueles nascidos em berços (mais ou menos) esplêndidos. É, sim, apenas uma hipocrisia beata daqueles que ignoram as bases da educação, da saúde e da segurança pública como motores para o desenvolvimento nacional e, então pessoal.
fdsE não é só isso: dizem-me que há inúmeros casos, a priori inexplicáveis, de pessoas que muito bem poderiam ser substituídas por um ventilador, uma samambaia, um bebedouro ou um porquinho-da-índia, mas que, tão apenas pelo princípio da física, estão a ocupar um lugar no espaço, para nada servindo e, ainda pior, para desespero do erário, ganhando uma sobrenatural remuneração.
fdsO cidadão paranaense é o patrão dos servidores e tem todo direito de saber para quem paga salários e quanto paga, diz acertadamente o Governador Requião; todavia, a medida será inócua e superficial, além de bizarra, se apenas servir como ferramente de curiosidade ou de vazias comparações.
fdsLogo, uma comissão deveria ser criado para investigar e saber o que (não) faz cada um dos seus servidores, quais são as suas (in)capacidades técnico-curriculares e qual (e como se mostra) o seu desempenho histórico nas atividades e no serviço dentro do Estado; porém, registre-se, grandes e paradigmáticas mudanças serão difíceis, pois os pseudoprejudicados serão certamente socorridos pelos braços convenientemente afáveis do Poder Judiciário, o qual manda equiparar, reintegrar, aumentar...
fdsAssim, em suma, tão-somente com a ficha completa de cada um dos servidores públicos, a cobrança da sociedade e a definitiva reflexão estatal acerca da configuração do seu plano estrutural-sistemático de cargos e salários, tal lista será útil, eficaz e funcional.
fdsCaso contrário, para nada servirá, senão apenas para catalisar os mais espúrios pecados capitais, acirrar o preconceito e mostrar que o talento quer significar a competência para se conquistar (e dissimular) outras coisas.
fdsEspera-se, pois, que dessa lista não sobrevivam todos.
fds