segunda-feira, 23 de maio de 2016

# ivo viu a uva



Roda cotia, de noite, de dia, o galo cantou e a casa caiu.

E eis que a ciranda dos amarelinhos muda o tom, muda o som.

Chega de fúria? Chega de atirar o pau no gato?

O que fazer agora que restou claro porque o golpe é golpe?

Com todas as letras, com todas as vírgulas e com todos os pingos nos is, ei-lo muito bem desenhado, dissecado e destrinchado, como numa necropsia, pelo bisturi de um dos mentores do processo: Romero Jucá (PMDB), o onipresente -- v. aqui.

É o cadáver do golpe, ali, deitado, frio, nu, com as vísceras expostas ao sol do meio-dia, sob os olhos de meio mundo.

A frase que resume tudo é, francamente, pornográfica: "Enquanto ela [a Dilma] estiver lá, essa porra [a Lava-Jato] não vai parar nunca", diz Jucá -- hoje Ministro do interino Temer, foi ministro durante três meses no Governo Lula e foi sacado por suspeita de crimes (v. aqui) --, dando o veredito dele e de alguns ministros do STF.

Com a gravação telefônica -- por que nada foi feito e só agora vazada, se ela é de março? --, a arquitetura e os elementos desta ópera bufa ficam na vitrine, para vermos ali, escancarado, em todos os detalhes: 

(i) que a ideia de tirar Dilma é para interromper as investigações e estancar esse papo todo de combate à corrupção;
(ii) que o novo governo vai, num "acordão", fazer ruir a Lava-Jato;
(iii) que com auxílio da velha mídia, a pauta dos noticiários será outra;
(iv) que tem dedos do STF no arranjo golpista;
(v) que o PSDB co-liderou a tramoia e tem salvo-condutos na MPF e no Judiciário; e 
(vi) que todos eles têm muito medo do que Lula e as ruas mobilizadas são capazes.

E resta a questão: como e por onde andará aquela matilha que praguejava contra Dilma, Lula, PT e uma ideia de esquerda no poder, todos esses símbolos magnânimos do eixo do mal, aquele feito de corruptos e incompetentes e em cujo ritual está comer criancinhas?

Bem, esse negócio de vergonha, de ter vergonha na cara, é claro muito relativo.

Mas já é um tal de enfiarem a cabeça na terra ou de fingirem “não é comigo” que torna a situação ainda mais constrangedora, como aquele sujeito que solta um pum em público.

Sim, pelas ruas, pelo trabalho e pelas redes sociais, um silêncio eloquente e que rubra a face destes personagens: parece que tenho em volta um bando com as mãos amarelas.

Incrível, isso.

Afinal, jamais essa turma, mais ou menos golpista, poderia acreditar que, em onze dias, (quase) tudo viraria pó.

Pirlimpimpim, e não mais que de repente fez-se a luz.

Ou, como num Segundo Dia por Ele desenhado, tem-se o firmamento.

Só que às avessas.

E em pouco mais de uma semana, caiu o mundo na República Federativa da Ordem, do Progresso, de Deus, da Família e da Propriedade.

"Ué, a gente não estava batendo panela para acabar com a corrupção?", se perguntam. "Cadê os cavaleiros da Távola Redonda que nos levariam para o Brasil sagrado?", indagam os adoradores do faz-de-conta contado pela Vênus Platinada. "E que horas o Aécio assume?", uns mais incautos hão de querer saber.

Nada estranho, extinguiram-se os comediantes de ocasião, aquela turma que fazia chiste do momento do país, fazendo graça de ver rasgada a Constituição, como se no espelho a cara gozada não fosse a sua.

Fingiram-se de mortos, rolaram, sentaram, deram as patinhas, foram atrás das bolinhas e, bem adestrados, jamais ousaram se soltar das rédeas que os amarravam à narrativa burlesca do "impeachment".

Ô, amarelinhos... agora não cola o papel de assoviar olhando para o nada e fazer cara de tundra.

Vamos: gritem, chiem, suem, estrebuchem-se na realidade.

Encarem a situação, não queiram posar de isentões e lamentem a sério a canalhice que ajudaram a promover: sim, vocês puseram no poder o que há de mais podre no reino da política brasileira, que atua com fim em si mesmo e sob as pautas e os programas mais reacionários do planeta.

Afinal, quem mandou fantasiar o gigante para se levantar contra a ordem democrática, contra as regras do jogo de um Estado de Direito?